segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Cárceres,prisões, possíveis libertações(or not)






Há também outras concepções de liberdade como,por exemplo,em um filme um tanto quanto atípico de um cineasta como Robert Bresson chamado Um Condenado à morte escapou.
Em uma conversa com o Júnior falamos dessa obra como uma espécie de "ET" na obra do cineasta e discorremos sobre a representação da relação entre finito e infinito no cinema,sobre a obsessão de Bresson por cárceres,etc.
Júnior considerou esse filme um tanto Rosseliniano na obra do cineasta francês.
Há,sem dúvida,uma dimensão diferenciada da Graça,que não se resumiria,a meu ver,em mera concepção de redenção.
Para entender mais abertamente, inicialmente pegaríamos pelo que essa palavra comportaria de representativa da ideia de gratuidade:"acasos",mistérios,bruscas precipitações,mesmo que físicas no espaço de um filme.
Correntes que se chocam e que aqui provocam um movimento intramundano a obedecer menos a um sistema determinista do que a uma espécie de gratuidade da e nas coisas,dentro de um sentido austero,mas um tanto deslocado em seu eixo pelas brechas de um grande esquema Formal-espiritual.

Em outra fase de sua obra,Bresson viria a filmar a partir de um lugar mais descaradamente materialista,dando ênfase às malhas circulares do mundo,como em O Dinheiro,em que as cadeias provocadas pelo fetiche mediador do título seriam precipitadas ad infinitum,girando em torno de si mesmas até a consumação apocalíptica do final.
Contudo, já não seria grande parte da carreira de Bresson,por seu tipo de austeridade jansenista,uma negação do mundo?Ou seja,a concepção religiosa em questão contida nas demais obras daria o tom,os germes dessa atitude um tanto niilista-apocalíptica.Já não seria o jansenismo uma radical negação do mundo?
O que,de certa forma,confirmaria os finais de filmes como Um Diário de um Padre e A Grande Testemunha,que funcionam como fim de um ciclo de vida carnal.De um ciclo de cada obra em presença.
No primeiro deles o pároco do título precipitará seu fim à base de uma ingestão de alimentos que só lhe provocava o mal(segundo especialistas),sem nada fazer para alterar o fato.
Mas é sobretudo na textura física e tensa das imagens,a sugerir um homem atormentado em seus cerceamentos,um pouco à maneira de um protagonista do romancista russo Dostoievski,que encontraremos as provas mais contundentes.
O final do filme sugere sua libertação,qual seja: a que se daria na e pela morte,pois como já dizia o arquetípico jansenista Pascal:"Cristo estará agonizando até o fim dos séculos".
Contrariamente ao estado de espírito e à ideia do versículo de um apóstolo de Cristo,João,a dizer:"“Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal".
Em A Grande Testemunha,um burro padecerá,ao longo de sua vida,de todos os males da humanidade:crueldade,indiferença..(não importa,por ser tudo parte de um mesmo imbróglio ontológico,não?).E somente encontrará seu repouso ao lado das ovelhas em seu leito,pasto de morte.A paz,enfim.
Em Um Condenado à morte escapou,um tanto ao contrário,a libertação opera dentro de uma possibilidade ainda encarnada e enraizada em um tempo finito,em um mundo histórico,portanto(ainda que dentro de uma postura de Resistência,que é a do protagonista),tal como em um filme de Roberto Rossellini(vide O Milagre,conto do Amor recém saído em dvd,Francisco,arauto de Deus,Viagem à Itália,Era Noite em Roma,Stromboli,...).

Sobre O Condenado:

"Para este herdeiro de Bernanos e Dostoievski,o mundo é uma prisão.É preciso fingir aceitar-lhe os muros,as grades,as portas,as armadilhas,para se descobrir por fim,quando nos julgamos perdidos,à beira do desespero,o caminho da libertação.Tudo o mais é silêncio"(Jean Collet).

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