domingo, 14 de fevereiro de 2010

Samba do Crioulo doido





Há também um lado fúnebre no Carnaval.Basta estudar como operava na Idade Média com as ameaças feitas à Morte,com essa logo respondendo e contraatacando.

Hoje já ocorre no Brasil um Carnaval a ser puxado pelo ano inteiro como nos "trilhos do Axé Bahia",o que pode comprometer o estado de espírito de "ritual"anual, a banalizar um momento tão específico(seria como comemorar réveillon e outras coisas mais pelo ano inteiro).

O Eros muito acirrado muitas vezes deixa entrever seu aparente e exato oposto:Tanathos,o instinto de morte.
Já que vivemos muitas vezes um somente presente,a-histórico(a galera sempre pergunta,por exemplo,para quê aulas de história.Dependendo do professor, concordemos),o "carpe diem" se (en)torna no caso brasileiro como mais barroco do que propriamente clássico,às vezes com a póstuma culpa católica ou agora (neo)pentecostal.
No caso clássico,haveria uma alegria atenuada,menos incitante,esbanjante,com a culpa sendo elidida.

Claro que o caso Carnaval estaria relacionado ao fato de um nos esbaldarmos antes de sermos pegos novamente pelo ofício de catar pregos,carregar pedras,do trabalhar muito para ganhar o mínimo para até mesmo respirar.Ou seja,como forma de corrermos de um tipo de morte cotidiana:morte do tempo,do respiro,do arejamento e,com isso,do espaço da imaginação.
Outras vezes as coisas podem funcionar por pura ou impura pobreza de espírito,mas que não deixa de soar como grito de desespero.
E, nos demais, como retomada de um caso de identidade(caso de parte da turma do morro),podendo operar como uma alegria até mesmo genuína, mais honesta,afirmativa.A ser até mais cultura popular,de "dentro para fora",do que propriamente cultura de massa,de "fora para dentro",bombardeada por cegantes holofotes e programações flutuantes do caldeirão bombástico da chamada sociedade do espetáculo.
Enfim,são casos e casos,mas com tudo isso podendo até ser misturado nas passarelas,como em caldo barroco ou neobarroco de um verdadeiro samba do crioulo doido.

Escolhemos uma música feita dentro de um estado de espírito mais desbravador,como a ala de um sanatório mais afirmativo.
(Se puderem baixá-la, vale a pena):

Jeito de corpo(Caetano Veloso)


Eu tô fazendo saber
Vou saber fazer tudo de que eu sou a fins
Logo eu cri que não crer era o vero crer
Hoje oro sobre patins
Sampa na Boca do Rio
O meu projeto Brasil
Perigas perder você
Mas mesmo na deprê
Chama-se um Gilberto Gil
Bode não dá pra enterder
Torna a repetir
Transcende o marco dois mil
Barco desvela esse mar
Delta desvenda esse ar
Não me digam que eu estou louco
É só um jeito de corpo
Não precisa ninguém me acompanhar

Eu sou Renato Aragão, santo trapalhão
Eu sou Muçum, sou Dedé
Sou Zacarias, carinho
Pássaro no ninho
Qual tu me vê na tevê
Falta aprender a mentir
Entro até numas por ti
Minha identificação, registro geral
Carece de revisão
Cara, careta, dedão
Isso não é legal em frase de transição
Sou celacanto do mar
Adolescendo solar
Não pensem que é um papo torto
É só um jeito de corpo
Não precisa ninguém me acompanhar

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