sexta-feira, 2 de julho de 2010

Quem cuida do Brasil?





Poderia aqui ,nesse espaço algo tênue,tecer algum pretensioso comentário sobre a Copa do Mundo,e os jogos do Brasil.

Mas,por um lado, é que não entendo mesmo nada do assunto,embora tenha lido com gosto os Manuais do Zé Carioca, nosso melhor jogador, junto a Pelé,Tostão,Zico e Garrincha . Que me perdoem os ditos anti-imperialistas.

Se algumas Copas foram (mui)bem armadas,outras certamente emplacadas com engenho e arte.
Poderia,mais pretensiosamente,falar também na já chamada "Sociedade do Espetáculo', visada por Guy Debord,atualíssimo e oportuno.Mas seria mais oportunismo que certas jogadas de times em campo e, talvez, a pior das malandragens.

O que mais me chama a atenção nesses casos é que, durante o período dos jogos do Brasil, nos tornamos patriotas de mão cheia, amamos nosso país,como um símbolo eterno, inscrito com gana e garra em nossos peitos. Delegamos a um time,o lugar de totens em nossas parcas vidas, em nosso esquivo sentimento de inferioridade que,por breves instantes, buscará desesperadamente sua compensação no furor de catarses programadas ou prefabricadas.

Ok,somos brasileiros! Devemos estimar o Brasil, independente do que isso venha a ser.
Mário de Andrade e Drummond,por exemplo, lutavam com afinco por descobrir.

Acontece que, no período dos jogos, nos apegamos tanto ao totem, a um modelo simbólico de identificação, que não passaria de um objeto fetiche a negligenciar a constituição do sujeito. Uma vez reconhecido como mero objeto, uma real individuação pode ocorrer. E,quem sabe uma descoberta do Brasil.

É Brasil!

Mas,acabado os jogos,voltaremos a esquecê-lo, como velho hábito e reprogramação,neglicenciando sua saúde, a cultura, educação, diluídas em momentos bombásticos ou histéricos?

Nos restará,por fim, uma pálida memória de um simbólico verde-amarelo, ao som de gritos e gemidos, enquanto velhos tabus socioculturais permanecerão, como os papagaios da buzina?


Ps-Apesar dos supostos clichês aqui mal trançados, por lidar com alunos- inclusive do Ensino Médio-, quem sabe poderiam desencadear conversas algo frutíferas ou não, como prolongamento no/do momento.

5 comentários:

  1. O futebol, principalmente em tempos de Copa, é parte estruturante do ser brasileiro (sejá lá o que for este ser). Embora suas observações e críticas sejam pertinentes,Alessandro, não dá para prescindir do espetáculo futebolístico como potência e estímulo aos nossos atos cotidianos. Em derrotas doloridas como a de hoje, para a Holanda, é que pessoas como nós, supostamente tão críticos, tão analíticos, nos descobrimos mais nacionalistas do que gostaríamos de admitir. Foi feio, foi vergonhoso, foi abjeto, e muito triste. Doeu e magoou.

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  2. É uma bela diversão,Sandro.Concordo.
    Mas não é algo que chega a humilhar,a não ser visto e constituído como ferida narcísica.Quando acreditamos que os jogadores sejam nossos representantes.
    O Brasil vai além e nesse ponto entra o nacionalismo da não omissão,o ético,que se ocupa do aqui e agora.
    Sentimos vergonha por sermos o país mais desigual da América Latina,ou preferimos nos anestesiar com o fogo de palha da Copa.. nos omitimos quando não lutamos,no jogo,por saúde,educação e cultura?

    Por isso digo,que é uma dor narcísica,de espectro de si,reforçada por uma desgastada indústria de espetáculo.
    Não é o jogo em si,Sandro,mas a histeria,o fato do Brasil se reconhecer em totens e,com isso,abandonar seu processo de individuação(é o que o totem faz,nesses casos).

    É a padronização de que é ser brasileiro e suaa omissão consequente,compensada pelo fogo de palha bombástico.Acabou,voltamos ao "não Brasil".

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  3. A questão é que em nosso país o futebol é coração. Longe de ser apenas uma diversão, ele eleva a autoestima do brasileiro. É um assunto de Estado. O fato de milhões assistirem e torcerem, muitas vezes histericamente (como você apontou), não constitui um problema, já que as pelejas da seleção não se dissociam da busca de nossa própria identidade e afirmação. Claro que falta empenho nas áreas essenciais (educação, saúde, segurança etc), falta consciência cívica e engajamento. Porém não dá pra considerar o futebol como simples modalidade esportiva e condenar a histeria, não no Brasil. Seria uma mutilação de nossa identidade. O que é possível é progredir nos assuntos político-sociais, sem deixar de lado a paixão futebolística que nos mobiliza a todos, de quatro em quatro anos. Uma coisa não anula a outra. O combustível moral do futebol é um fato inarredável.

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  4. Só me parece que o futebol hoje,A Copa, não representa o mesmo papel,assim como o carnaval,dos tempos,por exemplo,de um Nélson Rodrigues.
    Não é mera questão de nostalgia,já que os próprios jogadores não parecem representar tanto assim o país,mas multinacionais.Não parecem tão vinculados a esse húmus.Há uma lógica maior.
    É interessante e até válido que ocorra o evento e a torcida,,mas podemos deslocar um pouco essas unanimidades pra variar,já que os tempos são outros e o contexto bem diverso.Sem claro,como vc disse,ter de neglicenciar o futebol.
    Não deixa de ser uma reificação estranha que só isso ou quase pare uma nação ou a mobilize.Enquanto as escolas pedem pra não pegar pesado em linhas de leitura com os jovens,pois seria "muito pesado" para os mesmos.
    Trta-se um fragmento apenas do que vc chama de "identidade",é algo não somente partido,como frouxo.Como o humor catártico,que só descarrega,e se esvai.
    É pouco.E a moda hoje,em muitas esferas,é nivelar por baixo.
    Não é o caso de renegar o esporte em si,mas de problematizar totens unívocos,unanimidades eternas,enquanto o país é pautado por um anestesiamento intensivo,em hipnoses dispersivas,que pouco contribuem para seu desenvolvimento.
    Vejo isso em salas de aula,mas não somente.Será que é a única reserva lúdica que temos hoje?Não precisaríamos de descobrir ou resgatar outras reservas do tipo? Ou quer dizer que a apatia só parece alterar seu estado em eventos como esse?
    Ou seja,não gostaria menos do Brasil se não assistisse a um jogo,pois vira também um atestado de inclusão no "grupo".Mas não amaria menos o país por isso.
    Mas não é um ataque,somente um ponto de partida para novas reflexões,nacionais ou individuais.É meu papel como educador.Por vezes chato,mas é necessário que se problematize.

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