segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Dos Becos para a Indústria, da Indústria para os becos( Tom Waits/Disco de cabeceira)




Falando em artistas dos anos 70, não dá pra deixar de fora o poeta das margens Tom Waits.

Parecia haver nesse período uma onda decadentista também. David Bowie e seu Ziggy Stardust, um momento máximo do glitter, vestia suas máscaras e ia, em sua peça musical, à praça pública em pleno reino do rock tornado modismo de massa( indústria altamente planejada e organizada) para ser exterminado. Não somente a antecipação do ídolo que ascende e morre como um meteoro que cai, terminando por ser devorado por seus fãs( ecos de Michael Jackson).

Sobretudo aquele que não teme se sujar em praça pública, no reino das massas, dando sua cara para bater. Cada disco de Bowie seria uma frustração da persona anterior, se configurando como jogo com a moda, com as personas do rock. Isso nos anos 70, pois nos anos 80 a lei camaleônica torna-se norma máxima do faro marketeiro( vide Madonna, Michael).

Enquanto que em Bowie era, sobretudo, inquietação estética pela busca de novos rumos em sua música, enquanto cada personagem criada para cada novo disco era uma frustração dos modismos do rock e do poder de assimilação que a indústria tem de tudo incorporar até sugar forças.

Até os anos 70 o jogo de Bowie funcionou, enquanto nos 80 ele foi produzindo cada vez menos, para depois renascer das cinzas nos anos 90. O disco Let´s dance carregava um certo espírito conservador se cotejado com o que ele havia feito antes( Scary Monsters, Lodger, Heroes, Low, Station to Station...), mas ainda apresentava algumas pérolas. E para quem já sempre esperava do artista algo um tanto "insólito", não deixou de ser o disco mais um dado dessa "lei camaleônica", ao abandonar o descentramento mais explícito para se localizar numa espécie de centro pouco esperado para o artista. O interessante é que a produção musical foi de Nile Rodgers, produtor da Madonna na época, que se não fosse Bowie um talento à parte, resvalaria de vez na obviedade das obviedades. O que em parte ocorreu enquanto ícone, imagem pop do período MTV.
Nos anos 90, Rodgers trabalharia novamente com Bowie num trabalho infinitamente mais arrojado, ou seja, mais conformado à gana mais inqueita do artista: a inquitação como método de criação. Só que dessa feita a concepção musical não foi deixada a cargo de Nile. Ele acompanhou toda a visão de Bowie, procurando segui-la à risca.
Black tie, White Noise era o artista renascendo das cinzas de vez, correndo o risco de ser exterminado mais uma vez em Praça Pública. Contudo, para que a dimensão mais, digamos, experimental não parecesse mera redundância adentrada numa espécie de "Nova Ordem Mundial"da música e das modas, o disco intercalava com perfeição toda a inquietação sonora do autor com melodias mais redondas, mantendo a qualidade ímpar em ambos os pólos.

Voltando a Tom Waits, o decadentismo aqui não era do Ziggy Stardust de Bowie, mas mais extremamente o da poesia das margens, embebido, sem maiores performances, das beiradas das ruas, como no genial Rain Dogs, arrojado e careta na mesma proporção.

Em Rain Dogs , há por Tom Waits uma recriação pop dos vários escaninhos do cânone popular: polca, tango, etc... aos quais Waits injeta sua "poesia das margens" com sua rouca voz para deixar um Lou Reed enrubescido. Há até o jazz e um bocado do folk à la Bruce Springteen(outro grande artista que comparecia naquela década, os anos 70) e mesmo Leonard Cohen.

O disco da foto é da lindíssima trilha que Waits compôs para o filme de Francis Ford Coppola, O Fundo do Coração. O filme acabou de sair em dvd e seria uma ótima ocasião para revê-lo e "passar a limpo" essa inserção em princípio corajosa do diretor no reino dos musicais. É sabido que Coppola quebrou sua produtora com essa "extravagância". E talvez as pessoas quisessem se limitar no período a ver musicais no estilo John Travolta, e não um ousado reavivamento do imaginário/lúdico de "outros tempos".

Sei que Tom Wats compõs aqui um jazz inesquecível dentro do estado de espírito proposto, bem acompanhado por uma Crystal Gale cantando que é uma maravilha, como moça-crooner de peso dos ano 70, além de linda. Se o filme na revisão estiver à altura da trilha, corre-se o risco de ser uma obra-prima redescoberta.


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