segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Notas de(ops,sobre) Allen- Bate Papo






Enquanto em Sampa passa uma mostra sobre John Ford, e por aqui alguns filmes dublados, fico-ou vou- a dar uma passeada por blogs de cinema.
O chiphazard, do Sergio Alpendre abarca uma bela cotação de filmes do Woody Allen. Embora não concorde tanto com as dos últimos, no geral é fácil gostar de uma cotação que acaba coincidindo com a nossa. Foi o que, em geral, ocorreu.

Da primeira fase do diretor - mais anárquica, menos intelectualista, e mais despreocupada com o formato - fico com Dorminhoco e Bananas.

Viria posteriormente uma virada com Annie Hall - ou Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, no Brasil-, em que o diretor retoma elementos das comédias dos anos 30/40 de Hollywood, tanto na verborragia quanto no senso apurado das imagens(o que ainda não estava contido com força em filmes anteriores). Mas passado por um sopro de nouvelle-vague(a nova onda francesa perpretada por Godard, Rohmer, entre outros) em sua sede de flagrar ou experimentar, com leves equipamentos, um mundo.
Em Annie Hall, Allen consegue tratar com desenvoltura ímpar assuntos de densidade certa, como relacionamentos fracassados. Mas até mesmo pelo título, trata-se de uma homenagem, até certo ponto suave, à sua ex Diane Keaton, também protagonista na obra.

Muito tempo após, o ator-diretor retoma semelhante estado de espírito em Um Assassinato Misterioso em Manhattan, filme que parecia, por uma vez mais, renovar sua carreira e contando com a mesma Keaton.O tema aqui também é árduo. Trata-se da crise de um casal que, para compensá-la, passa a se envolver com os vizinhos do prédio. A suspeita de um crime recai sobre os últimos, mas o filme sugere, com sutileza e algumas indicações um pouco mais claras, que tamanho movimento de Allen e Keaton seria, em grande parte, uma maneira de escapar ao tédio de suas vidas. Tentativa de recuperação de algum fôlego em casamento falido(ou em vias de...).
O sentido de suspeição não se encontraria,portanto, somente nos vizinhos. Mas,tal como em Noivo Neurótico, Noiva Nervosa é como se tudo fosse leve, passando quase despercebido, como reconquista de "fôlego de cinema" para o diretor. O Assassinato Misterioso em Manhattan poderia ser uma espécie de John Cassavetes- diretor independente- com sinal trocado, em que a graça e o estranhamento dão suas cartas. Texto e subtexto implacáveis em condução de cool, suave aparência.

Após Noivo Neurótico..., o diretor emplacaria um dos seus destaques, Manhattan. Se existe ainda quem o considere pretensioso, o desfecho aposta em um tipo de simplicidade de que só os melhores musicais dariam conta. A trilha de Gershwin e o refinamento das imagens não soam pomposos, até mesmo pelo fato do artista saber rir de si. Nesse sentido, o final, a um tempo romântico e problematizante, opera como um bela aplicação de tapa de luva em si mesmo. Talvez sua obra-prima.

Já chegando perto do desfecho da obra Hannah e suas irmãs, a ex-fã de punk rock reencontra seu antigo desafeto- o próprio Allen - em uma loja de discos. Ao se movimentar no recinto, achega-se aos poucos ao ator, por intermédio do setor de discos de jazz. É como se, de uma hora para outra, a moça pudesse ter mudado de gosto, já que a velha briga do “casal” havia girado em torno de uma gostar de “rock barulhento” - nas palavras do protagonista-, enquanto o outro seria admirador confesso de jazz. Ao compararmos com o desfecho de Manhattan, o diretor faz o oposto. Submete a moça a seus gostos, acaricia seu ego nos termos de uma encenação, em que as palavras, em princípio, se ocupam de outras coisas. Mas a imagem, a direção opera como um imã a conduzir Dianne Weast até o protagonista – incluindo seus gostos.
Já o final instaura um tipo de ambigüidade, pois sabíamos, até então, pela obra, que o personagem de Allen era estéril, enquanto a moça, repentinamente, revela em uma festa de família estar grávida desse homem. Ambos recém casados. Haverá uma pausa dúbia na direção de atores, antes da reação de aparência positiva, verbalizada de Allen à notícia. Isso em luz baixa, sem que possamos ver com clareza as expressões implicadas.

Outros filmes de destaque são Broadway Denny Rose, - não tão bom quanto os anteriores citados-, mas apresentando raro frescor e sincero prazer na direção, embora pareça começar melhor do que em seu desenrolar para o final.

Maridos e Esposas é dos bons, como um desses trabalhos em que a câmera tremida consegue não estragar a obra, intercalando com planos estáticos momentos confessionais.Há certo tom do sueco Ingmar Bergman e novamente John Cassavetes, nuançados pelo humor do diretor. E pelo lúdico na cena em que há um blackout em uma festa de família e o protagonista consegue, enfim, beijar a protagonista. A câmera, ao chegar tão próximo à moça, capta seus desejos e hesitações em poros de pele. Parece impossível que pedisse outra coisa.São segundos no filme em que a fugacidade constitui a graça.

Volto um pouco ao mais conhecido A Rosa Púrpura do Cairo, superestimado em certos grupos, como subestimado em outros. Mesmo não sendo obra-prima, prefiro estar mais para o lado dos primeiros, com um tipo de generosidade sintonizada com o estado de espírito proposto. A licença poética novamente-, ainda que um tanto quanto dolorosa.

Como são muitos os filmes, destacaria ainda, além de Zelig, O Escorpião de Jade, por sua aparente modéstia e contínua invenção e reinvenção do humor, por saber explorar o espaço de investigação, alternado às espeluncas da vida privada.O diretor faz o que talvez seja o seu melhor. A partir da filtragem do repertório de certo cinema dito clássico, seja das comédias dos anos 30/40, passando por Groucho Marx, recria um tipo de cinema em tom de aparente despretensão, mas com forte sentido do lúdico e do nonsense, bem dosados. A saber, sem o comprometimento da lucidez nas revisitações, pela forma sóbria de enquadrar e narrar com arejado frescor.

Por ora, finalizo o papo das visitações com as provocações de Bruno Andrade (no blog Signododragao), com as quais concordaria, em parte, antes mesmo do pronunciamento do mesmo.
“Os Fracos não têm vez”, dos irmãos Cohen, que a meu ver, desde a primeira sessão,não teve tanta vez.
Superestimado,embora afetado em seus tiques de suposta inteligência e cinismo. O espectador não parece respeitado, como se os Cohen fossem uma exceção, uma “originalidade” à parte no cinema. É ao menos o querem provar, junto à falta de um real vínculo com o cinema,substituindo-o por um suspeito “cinema de arte”, em dadaísmo pedante.
O segundo caso diz respeito a outro trabalho supostamente superestimado em certos meios. Apesar de uma aparente boa condução e bonita filmagem, Bastardos Inglórias talvez peque justamente pela presença de ambas.
Com alguns bons momentos, revela-se, contudo, como mais envernizado do que o habitual em Tarantino. Como também mais autoindulgente em seu aspecto de obra “bem encaixada”- de pretensa “obra-prima”-, na opinião do próprio Tarantino ao declarar em entrevistas e no próprio desfecho do filme ter, enfim, fabricado a sua. Fabricação é a melhor palavra.

Mas discordo, Bruno, no tocante à Sidney Lumet, que em seus bons momentos consegue uma belo intercâmbio entre cinema e tv, o que passa por outros questionamentos e levantamentos sobre representações da imagem ao longo dos tempos.
Nesses casos,um registro que não comprometa o outro, ou outros. Em bons trabalhos,Lumet enriquece com particularidades o/seu cinema, com um poder de síntese que seria mais que reducionismo ou mero artesanato. Em certos casos, teatro, cinema e tv podem se imbricar muito bem.

“Vortemos dispois”, em outra oportunidade.


Ps.Ainda não assisti ao último trabalho de W.Allen.

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