
Em Colateral, os pontos mais altos se encontram no prólogo e no epílogo. Quando recorre mais à dramaturgia, seu filme parece menos interessante. Já nas construções de atmosferas é que ganha sua força.
De início, temos a poesia urbana, com suas muitas vistas a passear por ali, entrevistas por meio do retrovisor de um carro, a refletir um grande painel metropolitano, composto tanto por uma dimensão de sonho acordado, quanto pela de isolamento, solidão e prisão na selva.
Haverá, diante disso, o espaço para um mosaico de acompanhamento musical, que vai desde a música erudita, passando pelo pop e até o jazz, conforme o filme vai se desenvolvendo, com a noite se tornando madrugada e a poesia urbana se fazendo evidentemente crepuscular. Momento em que trilha e imagens remeterão a mudas reflexões.
Na mesma medida em que o filme ganha mais fôlego, Mann faz com que sua câmera busque vários tipos de ângulos a um só tempo, construindo um labirinto vitrificado, de concreto, em que desencontros urbanos passam a ser projetados em um âmbito mais individualizado, nessa busca por ar ou libertação.
É preciso aqui sempre correr mais, fugindo ou buscando, um tanto como em O Pagamento Final, de Brian De Palma, cujo desfecho se passa também em um metrô.
Será possível não somente observar a relação do cinema com a música, como tornar a respiração de cada rosto decisiva em suas implicações meditativas, com o recurso digital a intensificar a condição sensorial e mesmo tátil desse cinema.
Em termos de história, saberemos que o vilão Tom Cruise foi alguém privado de sonhos, tornando-se um robô programado na selva. Já para o protagonista, trata-se de ser ou não sugado pela mesma possibilidade.
Trata-se de dilemas desenhados digitalmente em uma cenografia pós-moderna, na qual os riscos de alienação do desejo e da morte da consciência, em uma provação de aventura policial, se fazem enormes.
Prolongando, de certa maneira, um grande filme de De Palma, inserindo-o em um contexto metropolitano atual, Colateral tende somente a crescer.
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