terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

E-mail número 1




Um amigo, que disse se considerar "cinéfilo amador", me enviou um e-mal dizendo ter assistido ao musical "Sinfonia de Paris". Muito embora não tenha gostado.

Reproduzo a resposta, dividida em duas partes:


"Concordo em grande parte com o que disse. "Sinfonia de Paris" é um musical menor "de Minnelli".

Mas por que coloco o "de Minnnelli", aqui, entre aspas?

A Europa havia realizado um musical ambicioso chamado "Sapatinhos Vermelhos", que fez muito sucesso junto à crítica e o público.

E, apesar de Vincente Minnelli, Stanley Donen ou Gene Kelly, o gênero ainda não era levado à sério nos USA. Os franceses, pra variar, foram dos que desconstruíram parcialmente tal visão (não somente a famosa turma dos Cahiers, de Godard, Truffaut, Rohmer,... como várias escolas à época).

A indústria norte-americana, tendo se assustado com o sucesso de "Sapatinhos Vermelhos", decidiu por produzir algo equivalente, como uma espécie de " resposta hollywoodiana" à façanha. Portanto, "Sinfonia" sempre me pareceu ser bem mais um filme de produção do que de direção.

Além do mais, uma figurinista deu a ideia de evocar uma variedade de pintores franceses para o acabamento na direção de arte. E para completar a "seriedade", alguém optou por melar o principal compositor popular norte-americano, George Gerswhin- o mesmo que flertara também com o erudito.

Sobre a última cena musicada- a que se refere- penso que guarda momentos muito fortes:

Em ritmo coreográfico, Gene Kelly chega à cidade já ameaçado pelo caos violento e suas mulheres tentaculares. Na história, o personagem é um pintor desempregado e perseguido exatamente por uma mulher poderosa que decide bancá-lo. Mas ao preço de sua alma.

O momento explora a desolação e confusão de sua mente, como também a busca por um mundo outro. É, então que, para o que você denomina "universo infantil", Minnelli fez uso de discretos e belíssimos movimentos de câmera, em que os cenários são expostos exatamente como são, ou seja, como artifícios, o que não diminuirá a magia. Pelo contrário.

Ou seja, não se trata de trapacear com o público (como dizia André Bazin) e, ainda assim, garantir a magia do melhor cinema lúdico (digno dos grandes pintores do "infantil", tais como Paul Klee ou Joan Miró). Infelizmente, a direção de arte sobrecarregada prejudica um pouco das imagens finais.

Fato é que o diretor, que amava a França, a filmou bem melhor em outros de seus trabalhos. Sendo esse um filme mais de produção do que de direção foi feito sob certas amarras com o intuito de abocanhar o Oscar e, como isso, ganhar a tal da "respeitabilidade" para um musical. O que, em termos, conseguiu.

Mesmo com seus méritos, não lambe as botas de outros musicais do diretor, como "O Pirata"( feito antes- a quem poucos deram bola à época), "A Roda da Fortuna", "Meet me in St.Louis", "Gigi",... para não falar nos melodramas e comédias.

Como o filme ganhou mesmo milhares de Oscars é mais lembrado do que a maioria deles (todos?), infelizmente. O que acabou se tornando um tipo de "erro histórico", uma possibilidade de incompreensão do melhor musical e, sobretudo, da arte de Minnell, aqui reprimida, achatada pelo peso de produção que se preocupava em mimar, com respeitabilidade, seu público.

Por outra, suas obras, no geral, contém ideias bem sutis embrenhadas em imagens, o que não deixa de comparecer, embora com menos brilho, nesse filme pouco autoral.

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