quinta-feira, 23 de julho de 2009

Nota sobre a questão dos gêneros ou "Chuvamos no molhado"

Existem cinemas clássicos e cinemas clássicos. Existe uma grande diferença entre o clássico mais acadêmico de um William Wyler e o "clássico" moderno de um Howard Hawks, por exemplo que, segundo um Rogério Sganzerla em seu notável ensaio, seria a matriz do cinema fenomenológico, ou seja, independente dos mecanismos habituais de interioridade psicológica, etc... Existe diferença entre o cinema poético, épico, mas de grande valorização do despojamento de um Ford e a maioria dos filmes ditos "de época" do período.
É preciso lembrar que quando falamos em "gêneros",esses só o são para os grandes artistas entre aspas, mil e uma aspas, ou seja, funcionam apenas operacionalmente como ponto de partida de um diretor, mas não de chegada, de desenvolvivento dessa arte. Ou funcionam instrumentalmente para o crítico( como o comentário aqui feito sobre Douglas Sirk) por exemplo, iniciar seu texto para um público, digamos, mais amplo, menos iniciado nas nuances, nas modulações decisivas da arte.
Mesmo os pólos clássico e moderno não se revelam estanques. Hawks é clássico e ultra-moderno, Nicholas Ray tem algo de clássico e muito de moderno já que, além do mais, junto a Samuell Fuller e outros mais, influenciou sobremaneira a dita "nouvelle vague( nova onda), composta por Godard, Rohmer, Truffaut, Chabrol...com sua poética do instante.
O que seria o cinema de Truffaut sem Hitchcock( como o primeiro mesmo afirmara), Chabrol( que junto a Rohmer dedicara o primeiro estudo sério do dito "mestre do suspense) sem o mesmo?Por quê um grande experimentador como Alan Resnais em filmes como Muriel, por exemplo, além de estabelecer citações( paráfrases) diretas de Hitch, trabalharia também atmosferas e recursos linguísticos do cara? Simplesmente porque Hitchcock, entre outras, já era ele mesmo um grande experimentador.
Poderíamos enumerar muitos exemplos como esses( como a relação Demy/Minnelli, Chaplin/Renoir ou Chaplin/Tati e Fellini....), etc,etc...
Prender-se a gêneros para falar dos grandes artistas americanos significa tanto quanto dizer que o grande cinema europeu seria pobre por filmar mais dramas, o que não deixaria, sob o ponto de vista desse raciocínio raquítico, de ser também e obviamente um "gênero pronto".
Mas tudo isso que digo aqui é um tanto óbvio, é chover no molhado, seja para os maiores ensaistas como para os próprios feitores da sétima arte. Ou, para os mesmos ensaístas que, baseando nesses diretores americanos de peso, se tornaram eles mesmos ao filmar, a grande prova viva e material do que defendiam em seus textos.

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