terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Listinha Número 2








Quando chove ininterruptamente,pode-se haver uma resignação ao mofo e suas serpentes e lêmures.Ou quem sabe brincarmos com elas,quando não há mais tempo para cantar e dançar na chuva como Gene Kelly.
A maior evidência de que um apocalipse estaria por essas bandas de cá é a sessão dupla do 2012 no centerplex na cidade de Lavras,Sul de Minas,não dando maior espaço para um filme a mais,que não seja um marketeiro Lua Nova.
Ao invés de correr para o shopping em busca do mais do mesmo,eu e minha esposa fugimos para uma lanchonete-café da cidade chamada Delícias da Casa(se não me engano),que veio incrementar com excelente atendimento e deliciosa atmosfera,a um tempo despojada e algo cosmopolita,nossa noite de Sábado.
Foi nesse bendito lugar que perpetramos nossa listinha de cineastas,entre sucos e sonhos.
Como bom cavalheiro(talvez de fachada),a da Dani pra começar,no melhor estilo The Girl is mine,mas a lista é dela:

Charlie Chaplin
Alfred Hitchcock(por esses dois nomes iniciais em sequência,permito-me um comentário:inglesinha,nem um pouco...)
Roberto Rossellini
Howard Hawks
Vincente Minnelli
Jean Renoir
John Ford
Clint Eastwood
Michelangelo Antonioni

(Quando fazíamos cada uma delas nos guardanapos,naturalmente não víamos a do outro).
A de meu punho:

Howard Hawks
Jean Renoir
Eric Rohmer
Roberto Rossellini
Vincente Minnelli
Alfred Hitchcock
King Vidor
Charlie Chaplin
Clint Eastwood


Uma foto(a segunda) é do cineasta francês Jean Renoir,filho do pintor impressionista Pierre-Auguste Renoir.
A escolha foi por conta de seu nome estar muito bem representado aqui e também por uma homenagem afetiva a seu filme La Bête Humaine,que tendo sido minha penúltima aquisição, mesmo assim não esperava que tanto me impressionasse nessa revisão em DVD.
Momento em que seu dom de de acolhimento dos seres-personagens,diante da impassibilidade da natureza e dos "fatos",não redunda em nada menos do que inteira obra-prima.

Ps(sobre a outra foto):Aguardo com certa ansiedade a última aquisição:o lendário A Tomada do poder por Luís XIV,de Roberto Rossellini(que em dvd no Brasil saiu com o nome de Absolutismo-A Ascensão de Luís XIV),o cineasta visionário italiano que traumatizou positivamente o cinema do pós-guerra.
Esse lançamento vem cobrir mais uma parcela de sua obra de quando ele migrou do cinema para a TV.Sua fase televisiva é menos conhecida,mas a se julgar por alguns títulos como Sócrates ou O Messias,é igualmente visionária.
Sua obra antes do clássico Roma,Cidade Aberta,filmado todo sem estúdio e fazendo milagre com parcos recursos,era adaptada ao regime fascista em voga.Com Roma veio o corte para uma postura mais urgente diante dos fatos e um posicionamento inovador de cinema.Pela recusa,entre outras,a uma empatia mais óbvia e imediata com o espectador via protagonistas ou via arcabouço cenográfico dos estúdios.A empatia em Rossellini não é buscada em princípio.Mas se não a procurava,ele bem a encontrava,como dizia Picasso.
Com Paisà,uma obra-prima de contos a partir de seres aparentemente anônimos e Alemanha ano zero,fecha com chave de ouro a chamada trilogia da guerra.
Com Ingrid Bergman(sua então esposa)uma fase muito rechaçada à época e hoje muito admirada,contendo os consagrados Stromboli,Europa 51(um de meus filmes favoritos,se não o favorito)e Viagem à Itália,que provocou assombros na Cahiers du cinéma pela desdramatização de uma história de amor entre o desgaste da "queda" e o resgate de um sentido de união para um casal.Isso tudo entre um Francisco,arauto de Deus(outra obra-prima)aqui e outra pérola acolá(Era noite em Roma,...).
Seu último momento é da da fase televisiva, por meio da qual pretendia educar o povo,contando a história de toda uma formação ocidental,inclusive de pensadores,via sua concepção visionária de arte,sem fáceis didatismos.Ao migrar para a tv,Rossellini fugia ao modelo espetaculoso do cinema que ganhava força com o tempo.
O diretor até o fim permaneceu fiel à sua recusa da "falsa empatia",optando por um rigor de extremo despojamento de estilo.Essa dureza do relato permitia as mais infinitas nuanças nas entrelinhas e no entorno de cenas.E ao cabo de suas jornadas,o resultado era não menos que uma empatia,ainda que outra que a habitual,não menos intensa,talvez até mais,em que o intelectual italiano deixava bem claro que se seu alvo inicial era a inteligência,essa abruptamente tornava-se fulminação da alteridade:um "outro" subterrâneo que se colocava repentinamente à superfície,em meio às bordas do plano de cinema,ou dos personagens.
Afinal,e um tanto paradoxalmente,o resultado do cinema de Rossellini,sua espiritualidade tão decantada,estava em total acordo com sua inteligência suprema do pathos:a emocional.E mais por ela do que por qualquer outro motivo,qual seja da ordem dos recursos,que sua obra permanece intacta como uma das mais instigantes do chamado Cinema Moderno,além de ser provavelmente a mais fiel porta voz dessa sensibilidade.
Sua obra televisiva é mais uma das provas de seu visionarismo.Um desses mal assimilados ainda hoje e que o veículo tv de nossos dias custará muito a conseguir acompanhar,estar à altura.

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