quarta-feira, 9 de março de 2011

Lançamento em DVD




"Tempestade sobre Washington", de Otto Preminger é uma obra destinada a não fixar em seu "turbilhão" nenhuma imagem para o espectador.

Preminger, como se sabe, filma a partir de quadros abertos, de maneira a abarcar uma grande massa de personagens, objetos e situações. O espectador pode se sentir perdido diante do fato de não saber exatamente para que lado ir, uma vez que o filme recusa a retórica dos cortes, ao filmar sempre em longos planos sequências (longas tomadas com breves interrupções).

No filme em questão, trata-se de mais um caso da Corte Democrática norte-americana. Ou seja, de um processo em que personagens fazem o que podem e o que não podem para impor suas “verdades”. O que interessa nessa democracia é, claro, o jogo dos poderes. Preminger filma em câmera baixa as escadarias que conduzem ao podium do Senado, o que reforça o estado de espírito algo megalomaníaco da coisa.

Diante de um quadro em que todos querem provar suas certezas, tal cinema nos conduz, vertiginosamente, de um lado a outro, com o máximo de atenção aos detalhes mais ínfimos. No entanto, nenhuma imagem se fixará. Na verdade, passará a ser negada pela posterior, que, por conseguinte, será anulada de alguma maneira.

A pátria das certezas passa, assim, a ser retorcida de seu interior, ao passo que a iluminação acinzentada reforçará o estado movediço das coisas. A rigor, o diretor filma o fugidio, ou seja, o que logo escapa, sob poder do tempo e das inconsistências.

“Sobre tempo”, é necessário dizer que Preminger capta breves instantes destinados a não perdurarem diante de nós. Personagens do alto de suas posturas são fadados ao afunilamento de suas convicções políticas, dentre outras. Inclusive o cínico senador, vivido por Charles Laughton, tão cioso de si, a carregar em seu corpo e rosto um contorno fantasmagórico, resultado de uma iluminação esbranquiçada a compor o quadro de um museu de cera, decadente.

Ninguém esperava que, diante de um filme que pareça prezar certo “distanciamento” haveria lugar ainda para um momento de melodrama, vivido por um homem chamado Ray: uma referência ao cineasta de mesmo nome- Nicholas Ray- que, tal como o referido personagem lutava por seus princípios, na mesma medida em que tentava se livrar das amarras de um passado?

Como "Tempestade sobre Washington" é quase um “filme de tribunal”, Preminger exigirá mais de seu espectador, a respeitar sua inteligência e sensibilidade. No mosaico proposto, há personagens de ambos os lados a lutar por seus princípios, mas o diretor parece, por um lado, não tomar partido. Ou, por outro, toma um pouco o de quase todos, como a dizer que muitos no mundo apresentam lá “suas razões”. O que não impede que mecanismos políticos sejam trabalhados e dissecados a partir da constatação que “os fins justificam os meios”, de maneira crítica e cruel.

A obra em questão, portanto, nos lançará no centro de um podium de poder para, a partir desse quadro, operar um movimento de descentramento. Pelos vai e vens da câmera ou dos acontecimentos restarão poucas certezas e, quem sabe, alguma possibilidade de construção. Junto a uma vaga lembrança do tempo segundo Preminger, captado como o esvair das coisas.

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