terça-feira, 19 de julho de 2011

Em sala: Flip- parte 2 (a discutir)






"A FLIP deste ano escolheu fazer uma homenagem a Oswald de Andrade e à antropofagia. É merecida a lembrança de um dos ícones da Semana de Arte Moderna. Chamaram até Antônio Cândido, 92 anos, para fazer um depoimento.

O mestre da USP, que conviveu com Oswald, é um dos raros casos de equilíbrio critico sobre o autor de "João Miramar". Consegue, afetuosamente, ver seus defeitos e virtudes.

Na década de 50, desaconselhou o poeta a candidatar-se à cátedra de filosofia, pois não via nele um pensamento conseqüente, apenas intuições mais ou menos luminosas. Como Oswald mesmo confessaria no seu diário, era um " bricoleur da cultura".

Portanto, esta deveria ser também uma oportunidade para se rever a obra e o pensamento daquele que causou certo furor em algumas tribos nacionais. Fazer isto não desmerece necessariamente as pessoas, mas esclarece a história.

Heitor Martins, por exemplo, já em 1968 escrevia um ensaio em que mostrava que a idéia da antropofagia de Oswald era tributária de Marinetti e Picabia. Veja-se o "Manifesto Canibal", de Francis Picabia (1920).

O movimento que alguns pensam ser essencialmente brasileiro, não o era. Que a teoria da antropofagia tem um certo charme, isto tem. Um belo marketing. No passado dei muita aula sobre isto e o assunto me seduz tanto que fiz um livro- " O canibalismo amoroso". Para usar a metáfora canibal, eu diria que Oswald deve ser devorado, não adorado. E quando a gente se banqueteia ou come algo, tem sempre umas partes indeglutíveis.

A teoria da antropofagia sobre ser característica universal e não especificamente brasileira: hoje com a globalização estamos todos sendo devorados, índios e civilizados.

Lembro-me de ter recebido a visita de Haroldo de Campos em Los Angeles nos anos 60. Um dia, num restaurante em Westwood, ele, que era siderado na teoria da antropofagia, me disse que estava perplexo ao constatar como os americanos, mais que os brasileiros, devoravam todas as culturas.

Oswald não era o grande poeta que alguns dizem ser, mas um captador de "roteiros", um agitador, um gênio fecundante que fazia um par de opostos com Mário de Andrade. Curiosamente ele gostava de Catulo da Paixão, cita Cassiano Ricardo como grande poeta brasileiro e silencia sobre Drummond ou Cabral.


Mas a coisa intrigante no famoso "Manifesto da Antropofagia" escrito em 1928 é que, depois que se espalhou que os caetés tinham cometido aquela atrocidade, os brancos tomaram suas férteis terras . Ou seja, os brancos é que devoraram os índios".

(Afonso Romano de Sant' Anna)

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