sexta-feira, 1 de julho de 2011

O Ranço crítico dos 60




Como ultimamente tenho ouvido muitas críticas a Paul McCartney e sua suposta "caretice", deixo aqui minha carta de defesa.

Ninguém é obrigado a aderir, claro. Muito menos se agradar de uma carta tão livre, endereçada a amigos de infância:



" Carregamos conosco um ranço de Maio de 68. Esse ranço já institucionalizado ( obrigado, Francis). Infelizmente, ele afeta a área das artes e, sobretudo, da música pop.


Haroldo de Campos não gostava de livros do Drummond como "Claro Enigma" ou " A Vida passa a Limpo", pois o papai noel da crítica esteve atrelado, até o fim, ao primeiro modernismo. Ou seja, não conseguia se desvencilhar de Oswald de Andrade e apreciar a grande poesia. (Pelo menos, outra delas).

De minha parte, por mais que aprecie poesia concreta, não posso deixar de mencionar que, se o crítico houvesse criado obras-primas como "O Relógio do Rosário", "Perguntas", " A Máquina do Mundo" ( dos livros anteriormente citados), sentaria em uma mesa para conversar sobre o assunto. Mas Haroldo, não sei. Era laboratório.


André Bazin, com todo seu arsenal teórico e sensibilidade não podia entender porque diabos Truffaut, Godard, Rohmer, Rivette,... Se opunham a ele- no caso Hitchcock, Hawks, etc.

E, como bem disse Bogdanovich, o estabilishment não suporta o "sucesso". Hitch, Hawks davam bilheteria à época. Portanto, não aceitariam também Frank Tashlin, Vincente Minnelli, Jerry Lewis..



Politiquezas na arte


Ah, o ranço político-ideológico na arte: McCartney, tido como"estrela", " pão duro" não militou em seu passado a favor dos "operários", assim como a Hitchcock interessava "somente" sua arte.

Lennon compôs "Working Class Hero", colocou capacete de operário em shows, mas possuía vários Aps espalhados por essa terrinha. Seriam para obras de caridade?

O importante, no caso, é o mínimo de coerência. Quando dizia que McCartney só havia composto Yesterday é porque morria de inveja por não haver composto as outras.



Crítica dos 60


A crítica pop que não conseguir se desvencilhar do ranço de Maio de 68 não pode ouvir música. Logo, tudo deve soar "jovial"- nunca envelhecemos, não é verdade? Hoje e ontem, podemos observar esses velhinhos de cabelo grande (ou raspado) a entoar os mantras de 68. Nada mais patético.



Abaixo um arremedo de texto encontrado sobre McCartney. É um trabalho de colunista- mais jornalístico do que de crítica. Mas creio que coloca bem alguns pingos nos is.

Ps. Ninguém precisa simpatizar com um homem para admirar sua obra. O mesmo se diga de professores que, para serem bons, não precisam "suprir as expectativas" dos alunos. E aprendi melhor com eles".

(O bloguista)





" Paul McCartney, que vem ao Brasil para os três shows mais esperados do ano, é o compositor mais bem-sucedido da história da música popular. E suas canções envelheceram melhor do que as do ex-parceiro John Lennon".



"Se certas pessoas são uma metamorfose ambulante - de malucos beleza a políticos em busca de votos -, Paul McCartney é uma hipérbole ambulante. Com Macca, tudo é macro. Segundo o livro Guinness de recordes, obsessivo com estatísticas, Paul é simplesmente o compositor mais bem-sucedido da história da música popular... Não tem para ninguém. E não apenas na esfera comercial, mas também na influência estética.


Claro que McCartney se projetou mundialmente­ pelos Beatles, a maior banda de todos os tempos. Mas, ora essa, os Fab Four, apesar do seu pedigree incomparável e da sua alteração de paradigma em áreas que transcendem as partituras, duraram uns relativamente mixurucos dez anos. Paul tem mais 40 anos de estrada posteriores ao conjunto. Somados os dois períodos, ele coleciona 60 discos de ouro e vendeu mais de 100 milhões de compactos simples só no Reino Unido.


Os leitores do site da BBC, a principal rede de comunicações britânica, elegeram McCartney como o maior compositor do milênio. Macca detém também os recordes de permanência mais duradoura no cocuruto das paradas musicais, tanto nos compactos como nos álbuns.

Na lista de músicas do show brasileiro, estão previstos sucessos da carreira solo de Paul e do tempo dos Beatles. Com base nas músicas, é possível meditar sobre como Paul se tornou o mago dos números acima - e talvez o maior criador de clássicos desde que a canção pop passou a ter o baixo e a guitarra como acompanhamentos principais. A resposta talvez esteja num longínquo dia de 1966, quando McCartney compôs a obra-prima que mudaria sua visão de mundo e sua carreira: Eleanor Rigby.


A composição é um painel vertiginoso sobre a solidão e a velhice, ancorado numa descrição de feição literária da personagem título. Na biografia autorizada organizada pelo jornalista Barry Miles, Macca diz sobre essa canção: "Aos 24 anos, que tinha na época, pensava em como seria quando tivesse 30. Ainda estaria tocando em uma banda? De alguma maneira, queria compor coisas "mais sérias". E Eleanor Rigby me pareceu um caminho". A partir daí, Paul passou a encarar a música popular de uma outra maneira. Andava nas ruas em busca de personagens com o objetivo de transformá-los em canções. Nascia um novo Paul - e nascia, também, uma nova fase dos Beatles.

Em Revolver está "For No One", talvez a mais pungente canção sobre separação já escrita, com seus versos: "Haverá um dia em que todas as coisas que ela disse encherão sua cabeça/ Você não conseguirá esquecê-la/ Mas nos olhos dela você não vê nada/ Nenhum sinal de amor nas lágrimas, choradas por ninguém/ Um amor que deveria ter durado muitos anos".

Em Sgt. Pepper's, está "She's Leaving Home", talvez a maior obra-prima entre todo o conjunto de fantásticas canções criadas pelos Beatles. A música se baseia numa notícia do jornal britânico Daily Mail, que falava de uma garota que saiu de casa e nunca mais foi encontrada.

Baseado nessa nota, Paul teceu um enredo em três atos com cenas que, de maneira sutil e altamente literária, dão o clima da história - a porta aberta devagar para não acordar os pais, o bilhete deixado pela moça, que não dava conta da emoção que sentia, a mãe lendo a carta de despedida no alto da escada, como um retrato da solidão. Mas o que John invejava mesmo era Eleanor Rigby - a ponto de espalhar, desonestamente, que era o verdadeiro autor da letra.



LORENZO DI MEDICI E A NOUVELLE VAGUE



Cabe entrar, aqui, na inevitável comparação entre Lennon e McCartney. Quem resume o talento de cada um de forma brilhante é o escritor - e crítico de música Arthur Dapieve: "Paul é o perfeito artista pop e, por isso, tornou-se o clássico dos clássicos modernos. Forçoso dizer que algumas canções mais políticas do Lennon ficaram datadas, por naturalmente fazer referências a fatos da época. Já Paul sempre apagou os rastros do tempo e do lugar, de modo a fazer com que suas músicas, mesmo as menos boas, se tornassem atemporais ou universais".

Até que ponto Lennon tinha consciência de que Paul caminhava para se tornar mais perene? Talvez mais do que se pensa. Depois de consumado o cisma dos Beatles, Johnnyzinho "paz e amor" empregou uma boa parte da sua energia ridicularizando a obra de Paul em sua carreira solo. Lennon chamava as canções dos Wings de muzak, o nome que se dava naquela época às músicas que tocavam em elevadores. E até se deu ao trabalho de compor, expressamente para o seu cupincha de infância em Liverpool, uma das músicas mais cruéis de todos os tempos, How Do You Sleep?, na qual informava ao mundo que "the only thing good you done was Yesterday" ("a única coisa boa que você fez foi Yesterday").

Essa "desconstrução" da imagem de Paul por John, para usar um termo caro aos marqueteiros políticos de hoje, de certa forma funcionou. Em alguns cenáculos, McCartney - sobretudo o Macca pós-Beatles - parece emanar uma persona algo farisaica, meio kitsch, quase filistina. Enfim, um fabricante de tolas canções de amor.

Durante a memorável década dos Beatles (os anos 60), John foi aos poucos se transfigurando em mais do que um integrante da banda hype. Mais do que um vocalista. Mais do que um guitarrista. Mais do que um compositor. Reciclado numa espécie de príncipe renascentista (tipo Lorenzo di Medici), foi canonizado como "autor" - não no prosaico sentido em que eu sou o autor deste texto, mas naquela acepção com que a Nouvelle Vague francesa aureolou os seus cineastas: um criador/ideólogo, um oráculo/ativista. Enfim, um expoente do cânone revolucionário.


Por fim, Lennon morreu assassinado por um daqueles mentecaptos ávidos por cada nanossegundo dos seus 15 minutos de fama. A contemporaneidade trituradora de mitos adora os mártires precoces. James Dean: "Viva depressa, morra jovem e deixe um corpo bonito". No século 19, o poeta austríaco Hugo von Hofmannsthal publicara uma série de obras-primas antes de completar 20 anos - e em seguida secou completamente, até o fim da sua longa vida. Um crítico malicioso exclamou: "Que grande poeta ele teria sido se tivesse morrido aos 19 anos!"

Enquanto John morria e era, de certa forma, canonizado, Paul seguiu vivendo e exercendo sua humanidade. Com o passar do tempo, foi sendo cada vez mais atrelado a uma reputação de pão-duro e mesquinho. Sobretudo depois do colossal barraco que foi o seu divórcio da segunda mulher, Heather Mills, 25 anos mais nova.


Sovina? Alienado? Bem, Paul defende há muitos anos os educação musical obrigatória, o direito dos animais. Militou em inúmeras campanhas contra as minas explosivas, a caça às focas, a dívida do Terceiro Mundo. Tendo testemunhado os atentados do 11 de Setembro do aeroporto JFK, em Nova York, McCartney foi o principal mentor de um concerto em benefício das famílias das vítimas. Ainda no mês passado, o "mais careta e egoísta dos Beatles" se mostrou solidário ao cantor George Michael, preso em Londres desde que foi condenado por dirigir sob efeito de maconha. Segundo o jornal britânico The Sun, numa carta de duas páginas, McCartney prometeu visitar o colega. Em se tratando de maconha e prisão, Macca tem alguma experiência. Em 1980, passou dez dias em uma cadeia japonesa por porte da erva.

Também arriscou seu prestígio atuando em outras áreas artísticas. Paul compôs trilha sonora, enveredou pela música clássica (entre outras, atuou com a Filarmônica de Liverpool, ao lado da soprano Kiri Te Kanawa). E é um pintor bissexto, mas palatável, melhor do que alguns colunáveis metidos que se pavoneiam nas bienais posando de vanguardistas. Basta consultar o livro Paintings.

A exposição de gravuras de Macca em Hamburgo mereceu ensaios aprovadores de vários críticos britânicos respeitáveis.Em que pé ficamos, no frigir dos ovos? Lennon ou McCartney?


Não se trata de achincalhar um para reabilitar o outro. Até porque Paul não precisa disso, e John não merece isso. Caramba, o que John ainda poderia nos ter dado! Paul? Bom, Paul continua a dar".

( Paulo Nogueira)

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